SOLIDARIEDADE por Maria Gorjão Henriques
Maria Gorjão Henriques
Mentora e organizadora do I e II Congresso Internacional de Consciência Sistémica
realizados em Portugal.
O conceito de Solidariedade implica ter um espaço interno para incluir o outro dentro de nós, mas, para que isso aconteça da forma certa, o outro precisa de ser incluído com total aceitação, e sem que queiramos mudar nada na sua dimensão humana, familiar, social ou racial.
A Solidariedade verdadeira implica perguntar, organizar, materializar e proporcionar ao outro o que ele precisa, à maneira dele e respeitando a sua cultura e modo de Vida. Esse caminho interno é longo e pressupõe algum desenvolvimento pessoal e espiritual, para que saibamos caminhar da empatia até à compaixão, com muita humildade, sem nos substituirmos ou enfraquecermos a dignidade.
Desde a conceção até ao nascimento, tudo tem uma ordem.
Como seres humanos, estamos vinculados a uma imensidão de sistemas. Desde o nosso corpo, à família, ao país, ao continente que pertencemos. Todos eles formam um sistema integrado e interrelacionado que nos influencia, sem estarmos conscientes.
Precisamos de aprender a viver em função deste entendimento para integrarmos, “da pele para dentro”, que tudo o que acontece com o outro também nos diz respeito e, ao mesmo tempo, influencia o desenvolvimento da consciência coletiva, a partir da
qual todos nós nos alimentamos, nos níveis mais profundos do nosso Ser.
Ainda somos muito pouco conscientes das reais motivações que nos fazem abraçar certos projetos, tomar determinadas decisões e até mesmo escolher e determinar o que tantas vezes chamamos de Missão de Vida.
A questão de fundo prende-se com as reais motivações que sentimos quando decidimos querer Ser Solidários, e oferecer o nosso tempo e energia a alguém, ou mesmo a uma causa ou projeto de Solidariedade Social?
Temos vários níveis de lealdades que nos movem até sermos capazes de discernir o que, na nossa pureza e essência, se expressa através de nós.
Até conseguirmos ser lúcidos e conscientes de todas estas influências sistémicas somos movidos e motivados a atuar através de vários níveis de lealdades, independentemente de algumas partes de nós poderem estar ao serviço do algo maior, a partir do qual a vibração da nossa Alma se expressa. Na realidade, somos movidos por vários níveis de consciência, e cada um desses níveis está ao serviço da completude, da inclusão e da necessidade de equilíbrio que em algum momento do tempo foi perdida.
Podemos sentir-nos chamados a viver a nossa vida através de projetos de solidariedade, mas é importante observar que existem vários níveis de motivação que nos podem convocar a viver dessa forma:
- A nossa Alma ter o chamamento natural inato para movimentos de solidariedade, porque nascemos com um determinado propósito e sentimo-nos movidos, empurrados, para que a vida se expresse através da forma como nos doamos. Então, permitimos que o que se expressa através de nós, reverbere para fora de forma natural;
- Sentirmo-nos motivados a envolvermo-nos nesses projetos como uma forma de compensação para com alguém, ou para com uma memória familiar de injustiça, humilhação, pobreza, vazio, destinos difíceis ou algum evento marcante da nossa família de origem que, de alguma forma, espiamos através da maneira como nos doamos. Neste caso, procuramos compensar, através dos outros, essas memórias próprias do clã.
- Alguns traumas acumulados da nossa infância, e, por sentimentos de carência, precisarmos de dar aos outros o que na verdade não tomamos para nós ou de nós próprios.
Nos últimos dois casos, a necessidade de reconhecimento e de compensação servem de motor para que a pessoa se dedique, de corpo e Alma, a uma causa que, na verdade, mais não é do que a necessidade de devolver ao clã a sua dignidade ou o sentimento de inclusão, de forma a ser vista por si mesma.
É possível que em cada um de nós resida um pouco de cada uma destas versões e motivações mais inconscientes, que a dança da Vida nos mostra através dos véus de ilusões que criamos, e que vamos derretendo à medida que evoluímos e lidamos com a princípio da realidade.
É sempre mais fácil projetarmo-nos fora de nós, e vermos nos outros as suas dores e vazios, do que mergulhar na verdadeira solidariedade para connosco próprios, e assumirmos que essas dores também são nossas.
A vibração do coração precisa de ter o seu espaço interior para reverberar para o exterior.
Seremos todos capazes de ser solidários no dia em que aprendermos a viver pacificados em nós. Nessa altura, não será precisa solidariedade, porque todo o Ser Humano estará a ocupar o seu lugar, e não haverá desigualdades sociais.
Até lá, só posso expressar a minha profunda gratidão por todos nos sentirmos empurrados a compensar dores e lealdades inconscientes desta forma “solidária”. Apesar da projeção, muita coisa é feita, e muitas Vidas encontram um porto seguro!!!
Bem-haja à Vida!